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quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Mortes e ressurreições nas HQs: Um círculo vicioso

Gwen Stacy: morte marcante e definitiva
A morte nem sempre foi um tema muito recorrente nas Histórias em Quadrinhos (HQs) e, quando acontecia, (na grande maioria das vezes) era pra sempre. O personagem morria e ponto final. Foi assim com o tio Ben, de Peter Parker e também com a Gwen Stacy (Homem-Aranha), o Capitão Marvel (da Marvel) e, durante muito tempo, com a Jean Grey/Fênix (X-Men). 

Nos dias de hoje, principalmente por causa de uma certa morte de um certo personagem icônico da DC Comics lá no ano de 1992 há mortes e ressurreições num ritmo que, sinceramente, vem se tornando monótono ao longo do tempo e contribuindo negativamente para a qualidade do que vem sendo publicado (principalmente no mainstream) em forma de arte sequencial, conhecida carinhosamente como Nona Arte.




Primeira grande morte com retorno
A morte que pôs fim às mortes
Devido a quedas cada vez maiores nas vendas das revistas mensais do Superman, editores e o pessoal do  Merchandising da DC Comics (editora norte-americana que publica o personagem) resolveram solucionar o problema dando uma guinada total nas histórias do herói, colocando-o novamente no centro das atenções dos leitores e também de toda mídia impressa e também audiovisual. O que foi feito? Mataram o cara. E o responsável por tal feito? Um personagem que foi criado especificamente para isso: Apocalypse.

Não quero aqui dizer que a história foi péssima. Além de se tratar de uma trama razoavelmente interessante que foi prendendo a atenção enquanto rolava (no Brasil foi publicada originalmente pela Editora Abril em um encadernado em formatinho, menor que o americano), conseguiu atingir sua principal meta: ressuscitar as vendas das revistas do personagem, que já beiravam ao cancelamento e, de quebra, ainda inseriu novos personagens que originaram novas revistas a partir da fase posterior à morte do personagem. Aí foi que tudo começou a degringolar de vez.

A Marvel já matou até o Capitão América
Praticamente todo ano as duas principais editoras do mercado estadunidense (Marvel e DC) passaram a cria história com mortes de seus principais personagens como soluções fáceis para alavancar as vendas das revistas. Com isso passaram a perder as histórias, que na maioria das vezes foram ficando cada vez mais rasas ao ponto de hoje o tiro praticamente sair pela culatra, já que a morte é tão lugar comum e previsível que no ano seguinte vai ser feita uma nova campanha midiática marcando o retorno do personagem à vida.

Já mataram o Ciclope, Colossus e novamente e de novo a Jean Grey e já tão prometendo matar o Wolverine (todos dos X-Men) no ano que vem, o Batman, o Capitão América, o Visão (Vingadores) entre vários outros personagens. Alguns com histórias melhores, outros bem fracas mesmo. O preocupante disso é que nem se reflete mais sobre que se pode fazer de realmente bom para alavancar as vendas das HQs. Estão ruins? Mata o personagem que tudo vai melhorar! 

Com isso perdem os leitores, os artistas, que acabam ficando limitados a decisões editoriais que cerceiam suas imaginações, que poderiam lançar histórias bem mais interessantes, seguindo outros plots, fruto de suas próprias reflexões acerca dos personagens com que estão trabalhando. Perde também a própria mídia, como um todo que se torna previsível, num círculo vicioso e ao longo do tempo vai tornando-se desinteressante por esse motivo. Acaba-se investindo em eventos bombásticos que nada de realmente sólido acrescentam às histórias, pois, em breve, tudo volta ao status quo anterior.


Ótima edição de abertura da fase
de Grant Morrison nos X-Men
O que fazer?
Lá pelos anos 80 surgiram nas HQs autores que realmente ousaram, mesmo não sendo grandes “assassinos /ressussitadores" de personagens. Alan Moore ("Watchmen", "V de Vingança", "Monstro do Pântano"), Neil Gaiman ("Sandman", "Orquídea Negra", "Livros da Magia") e Grant Morrison ("Homem-Animal", "Os Invisíveis", "Novos X-Men", "Superman: Grandes Astros") foram os três primeiros grandes nomes do que futuramente se tornou o selo Vertigo (linha adulta de HQs da DC Comics). 

Dessas mentes surgiram histórias realmente geniais, não apenas com suas criações, mas também com personagens icônicos tanto da Marvel quanto da DC. Só pra citar coisas mais recentes, como esquecer “O que aconteceu com o Cavaleiro das Trevas”, réquiem inspirado e homenagem de Neil Gaiman fez ao Batman em apenas duas edições das HQs mensais do Homem-Morcego, ou mesmo a controversa e marcante fase que os X-Men atravessaram pelas mãos de Grant Morrison no início dos anos 2000 que gera reflexos até os dias de hoje nas revistas mutantes. Alan Moore, por sua vez, deixou de lado as grandes editoras mas tem contribuído muito para melhorar a qualidade geral do que vem sendo impresso, que o diga sua "Liga Extraordinária", formada por personagens da literatura clássica sob o ponto de vista do autor recluso.

Nem precisa ser um grande cânone como os supracitados pra fazer histórias que ao menos garantem um bom entretenimento sem ter que matar e ressuscitar personagens anualmente. Joss Whedon teve uma ótima fase à frente dos “Surpreendentes X-Men”. Brian Azarello e sua história criminal "100 balas" nos proporcionou uma viagem ao submundo da máfia norte-americana com passagem só de ida. Brian K. Vaugan é um dos mais criativos autores da nova geração, com as inovadoras e já concluídas “Ex-Machina” e “Y: O Último Homem”, ou mesmo a edição especial “Leões de Bagdá”, uma fábula atual sobre a guerra no Iraque. Jason Aaron, apesar de ser uma inconstância maior que os demais na qualidade de suas histórias, nos presenteou com "Escalpo", uma história que mostra a degradação da cultura indígena no cenário atual, recheada com balas, drogas e sexo, sem poupar o leitor de nenhum detalhe obscuro.

Leões de Bagdá: Uma outro olhar sobre a guerra no Iraque
Boas histórias não precisam ser cerceadas. Basta apenas deixar os artistas fazerem o que nasceram pra fazer que daí, mesmo sem forçar muito a barra, podem sair verdadeiras pérolas que ficarão marcadas para sempre. Nem sempre é preciso brincar com um tema tão sério e definitivo para se contar uma história de entretenimento de forma eficiente e satisfatória, agradando leitores e gerando lucros às editoras. Pode ser um caminho um pouco mais complicado, mas com isso todos ganham.

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