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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

"Valente": uma história que se confunde com a de cada um de nós

Os três volumes de "Valente" recém-
lançados pela Panini
Estão disponíveis em bancas e livrarias espalhadas por todo o país as edições Valente Vol. 1“Valente para Sempre”, Vol. 2 “Valente para Todas” e o Vol. 3 “Valente por Opção”, coletâneas que reúnem, em sequência, as tirinhas de Vitor Cafaggi (Coleção Graphic MSP - Turma da Mônica: Laços) lançadas originalmente no "Jornal O Globo" e que também marcam presença no blog de VitorOs dois primeiros volumes já haviam sido publicados pelo artista de forma independente, mas já se encontravam esgotados e agora têm relançamento pela Panini juntamente com o terceiro inédito. A editora apostou no trabalho de Vitor após o grande sucesso da edição "Turma da Mônica: Laços", feita juntamente com sua irmã (Lu Cafaggi) para o selo Graphic MSP (também da Panini).   

Afinal, do que trata Valente?
Vitor no lançamento de
Turma da Mônica: Laços
As tirinhas contam a história de Valente, um tímido e empolgado cãozinho que está tendo seus primeiros contatos com o mundo feminino. O interessante é que elas são complementares, como se se tratassem de pequenos capítulos de uma série de TV, mostrando a evolução do personagem de uma forma que muitas "Graphic Novels" ou até mesmo livros não conseguem fazer.

Não tem como ler as desventuras de Valente sem lembrar de situações semelhantes (às vezes até ridículas) porque passamos ao longo de nossas vidas nessa época tão conturbadas que, se não tomarmos cuidado, aos poucos vamos esquecendo e deixando pra trás. Ler Valente é como um retorno à nossa adolescência, nossos amigos confidentes e todas as nossas primeiras “garotas de nossa vida”. A sensibilidade do autor pode ser sentida a cada quadro, cada palavra. Vale a pena conferir. 

A partir de Valente pode estar sendo criado um novo paradigma para os quadrinhos nacionais, com sua disponibilização em bancas e livrarias a preços não tão astronômicos a ponto de impedir que muitos leitores tenham acesso à histórias de qualidade feitas por talentosos artistas brasileiros.

A única crítica vai para o lançamento simultâneo de todas as edições, que poderiam ser lançadas aos poucos dando oportunidade à mais pessoas de adquirirem os três volumes de Valente. 

Algumas tirinhas do Vol. 1 "Valente Para Sempre"

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Selvagens à Procura de Lei: A volta da rebeldia (com qualidade) ao Rock Brasil

Logo da banda remete ao psicodelismo
dos anos 70 e à  Tropicália
Há um bom tempo a cena (Pop)Rock nacional está carente de bandas realmente interessantes (e, sob certa medida, inovadoras) e foi justamente de onde menos se esperava que surgiu, antes tarde do que nunca, a bem-vinda surpresa. Formada em 2010 em Fortaleza-CE (terra conhecida pelas bandas de forró) por Gabriel Aragão (voz, guitarra e piano), Rafael Martins (voz e guitarra), Caio Evangelhista (baixo) e Nicholas Magalhães (bateria) os Selvagens à Procura de Lei ou simplesmente "SaPdL" fazem uma fusão de várias vertentes do roquenrol. Ouvindo o álbum homônimo lançado no ano passado, o primeiro do quarteto lançado por uma gravadora,  é possível viajar à várias épocas diferentes, desde os Beatles (anos 60), passando pelo Pink Floyd e Tim Maia (anos 70), Legião Urbana e Cazuza (anos 80), chegando a bandas mais atuais, como The Strokes, Franz Ferdinand ou Artic Monkeys, entre várias outras que eu, por limitação de conhecimentos musicais, talvez não tenha isolado.

A temática das letras oscila entre a MPB dos anos 70, um dos períodos de alta criatividade na música, com referências a artistas como Fagner, Belchior (“...as velas do Mucuripe vão bater no Planalto Central”, dizem eles em Mucambo Cafundó), Milton Nascimento, entre outros e do Rock/Brasil dos anos 80, principalmente por conta da rebeldia de algumas delas, como “Brasileiro”, “Massarara” e “Mocambo Cafundó” com temáticas similares ao que sentimos ouvindo “Que País é Este” (Legião Urbana) ou “Brasil” (Cazuza). Hinos de revolta contra a situação do país e a própria inércia das pessoas diante disso. Convenhamos, estava mesmo faltando rebeldia aos nossos jovens roqueiros atuais, que tantas vezes mais têm se preocupado com suas roupas ou penteado que com a música que fazem.

O quarteto consegue ser inteligente sem ser chato, como podemos conferir em “Senhor Coronel” (uma reflexão sobre o que realmente é importe na vida) ou “Crescer dói”, sobre aquele momento entre o fim da adolescência e começo da idade adulta, repleto de dúvidas e medo do desconhecido, onde a principal pergunta é: o que eu quero mesmo da minha vida?

Imagem de capa do CD da banda,
lançado no ano passado
A banda não deixa de lado as canções de amor (sempre elas!), expondo ao público sua veia romântica com muita qualidade em canções como “O amor existe, mas não querem que você acredite” (uma reflexão interessante sobre o tema), “Música de amor número um” (uma declaração endereçada à namorada de Gabriel), “Despedida” (autorreferente). Todas são reflexões sobre o tema e não apenas canções de amor escancaradas, o que já é um diferencial diante de outras tantas bandas que vemos por aí. 

Outra característica marcante da banda é que todos cantam uma hora ou outra, como vocal principal ou backing vocal (sempre corretos e bem executados). Até mesmo Nicholas, sem se distanciar das baquetas, teve o ensejo de mostrar seu lado vocalista no refrão de “Despedida”. Todos o fazem, sem com isso deixar “cair a peteca”, mantendo um bom nível vocal em todo o álbum. A banda consegue manter uma boa coesão, sem grandes oscilações que poderiam baixar a qualidade em algum momento. 

Quanto à parte instrumental, a maioria do repertório é à base de guitarras, baixo e bateria, mas há também a presença marcante de um piano eficiente em algumas faixas, sobretudo nas canções mais românticas ou reflexivas. A banda foge de simplificações, com arranjos relativamente ousados, sobretudo se comparado a outros grupos atuais. Sempre alguém está fazendo alguma coisa diferente de apenas uma simples batida nos acordes de seu instrumento, com riffs ou dedilhados interessantes à guitarra, linhas de baixo marcantes ou viradas de bateria que em muitos momentos dão aquele quê a mais nas canções.

Se você ficou curioso e quer saber um pouco mais sobre a banda, eles têm um site interessante onde além de vídeos e fotos apresentando a banda e informações sobre o que eles andam fazendo, disponibilizam algumas músicas para download gratuito e o CD da banda em formato digital à venda através do iTunes. Cliquem aqui e confira, que vale a pena, pois tem muita coisa anterior ao lançamento ao álbum aqui comentado que nos faz conhecer ainda melhor as influências e a qualidade dos som da banda. Abaixo você pode conferir o clipe de Mucambo Cafundó, lançado em 2011 pela banda, que foi apontada como grande aposta pela VMB 2012 (premiação da MTV Brasil). Entre outros importantes festivais, a banda está confirmada pra toca no Loolapalloza Brasil 2014 no próximo dia 06/04.



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

"Preacher": No meio do campo de batalha entre o Céu e o Inferno

Pôster com vários personagens que de "Preacher"
Se você já é um leitor antigo de HQs, com certeza já deve ter lido alguma coisa ou pelo menos ouviu falar de “Preacher”, uma pérola dos anos 90, considerado por muitos um período negro dos quadrinhos devido à baixa qualidade do que foi produzido na época. A série ultraviolenta e, a princípio, nonsense, de Garth Ennis (roteiro), Steve Dillon (arte) e Glenn Fabry (capas), foi publicada mensalmente pela Vertigo (selo adulto da DC) entre 1995 e 2000 e conta a trajetória nada santa do ex-pastor Jesse Custer, ao lado de sua ex-namorada Tulipa e de vampiro irlandês “muy amigo” de ambos, Cassidy, formando uma estranha trupe que viaja ao redor dos Estados Unidos à procura da resposta para uma simples pergunta: “Porque Deus abandonou o Céu?”. Pode parecer um plot capaz de fazer qualquer pessoa mais religiosa (principalmente católicos) passar longe da publicação, se negando até mesmo a continuar lendo as linhas que se seguem, mas, garanto que, mesmo quem tem suas crenças, se tiver a mente um pouco aberta a outras formas de concepção das coisas, poderá se divertir um bocado com a obra e até mesmo refletir sobre sua posição no mundo.

Um pouco da história
Gênesis: Fruto malfadado 
de um amor proibido
Tudo começa quando durante um de seus sermões o pastor é atingido por uma força que incinera toda a sua igreja juntamente com seus fiéis, deixando apenas ele vivo sem entender qualquer coisa sobre o que aconteceu ou como sobreviveu. De repente ele se vê capaz de, com uma simples palavra, obrigar qualquer pessoa a fazer qualquer coisa que ele peça, desde um simples pedido, como fechar a matraca, como “se foder”, literalmente (de verdade!). Esse “Dom da Palavra” acaba tornando o ex-pastor uma peça decisiva campo de batalha entre o Céu e o Inferno e isso o faz passar por várias provações, pois não queria se envolver em nada disso, apenas cumprir sua meta inicial, a qualquer custo.

Aos poucos ele descobre que "Gênesis", uma entidade fruto do amor entre um anjo e um demônio nasceu naquele momento se fundiu ao seu corpo e ao longo da história vai encontrando seus parceiros de viagem e outros interessantes personagens, como o “Santo dos Assassinos”, um pistoleiro do século XIX, o “Cara de Cu”, um jovem fã do Nirvana que tenta com a ajuda de uma arma (sem sucesso) seguir o caminho final de seu ídolo, resultando numa aparência horrenda, como sua alcunha sugere, e Herr Starr, um militar defensor do culto religioso Santo Graal, que deseja ter em seu poder o messias renascido a qualquer custo (qualquer um mesmo).

Cara de Cu: um dos coadjuvantes mais interessantes das HQs

Comentários
A  história é puro cinismo impresso em celulose, com palavrões, sexo, pancadaria, sangueira e as mais variadas personagens tão bizarros quanto as situações a que estão expostos, recheadas de críticas à sociedade ocidental católica-cristã e referências à cultura Pop, como os antigos filmes faroeste (Custer tem John Wayne como um conselheiro invisível) e musicais diversas (da música mais interiorana de raiz ao rock contemporâneo).

Enfim, a conclusão chega ao Brasil
O roteiro é contado de forma não-linear, ora visitando o passado dos personagens (ou até mesmo de seus pais), ora voltando ao presente, constantemente mudando tanto o ponto de vista sob o qual que a trama é contada, ao ponto de o protagonista da série se confundir, sendo Cassidy durante algumas edições, por exemplo, depois voltando a ser Custer, o que torna mais consistente a trajetória de cada um deles, mostrando como cada um se tornou o que é mostrado. 

“Preacher” teve 66 edições mensais (número sugestivo), cinco edições especiais e mais uma minissérie especial (spin-off) do “Santo dos Assassinos” e foi compilada nos Estados Unidos em 9 encadernados. No Brasil, Após uma série de transtornos e passagem por várias editoras e formatos, a publicação finalmente chegou ao fim em 2011 pelas mãos da Panini, que lançou os três últimos volumes e após o último, “Álamo”, tem se dedicado a publicar todos os anteriores para que os leitores possam finalmente completar sua coleção em um único formato (luxuoso, diga-se de passagem, com acabamento em papel couchê e capa dura). Recentemente chegou às livrarias o terceiro encadernado, “Orgulho Americano”, faltando agora apenas o quarto, quinto e sexto para que a série seja completada pela editora.

Se você é fraco do coração, não vou nem insistir pra que dê uma chance à série, pois ela pode te levar a fortes emoções e eu não gostaria de ser o responsável por qualquer mal que possa te acontecer. Leitura altamente recomendada pela Taverna, mas não se esqueça de ler as contra-indicações acima.

Personagens centrais de "Preacher":
Custer, Tulipa e Cassidy